Literatura Cearense

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Location: Fortaleza, Ceará, Brazil

Sunday, October 30, 2005

Farias Brito

Idealismo

A poesia leva ao idealismo.
Note-se, porém, que a palavra idealismo não é aqui empregada na acepção comum, não serve para representar um dos sistemas em voga da filosofia moderna. Por esta palavra empregada na falta de outra equivalente quero indicar uma das forças vivas do homem, a energia criadora do ideal. A poesia é justamente esta energia.
Bem sei que esta concepção vai de encontro às idéias comuns. Há sem dúvida aí um certo quê de extra-utilitário que não poderá agradar àqueles a quem o hábito das discussões positivas e a exageração pelo sistema materialista têm feito sectários da dogmática do egoísmo.
Sabe-se que é justamente este o característico predominante do pensamento moderno: nota-se na generalidade dos pensadores contemporâneos uma tendência bem pronunciada para o aniquilamento de todas as manifestações do espírito que não tiveram por fim a satisfação das necessidades físicas ou puramente intelectuais, isto é, que não tiveram por fim o conhecimento ou a economia.
Que temos nós com a magnitude do oceano, com a beleza dos campos, a suavidade das fontes, a delicadeza das flores, em uma palavra: que temos nós com a harmonia e os esplendores da natureza?
A vida é um conjunto de necessidades: todos os nossos esforços devem consistir em trabalhar para satisfazê-Ias, e os meios de trabalho reduzem-se a dois: a ciência e a indústria. Querer alguma coisa mais além disto é deixar o terreno sólido da realidade e perder-se no mundo da fantasmagoria. A poesia, portanto, do mesmo modo que todas as belas-artes em geral, não é senão uma divagação fora da natureza ou pelo menos sem aplicação útil no mecanismo da sociedade. É para a indústria, ou antes, para a arte, no sentido restrito da palavra (arte útil, manufatureira), o que é a teologia para a ciência. uma aplicação desnecessária da energia, um esforço no vácuo.
Por mais que pareça exagerada esta conclusão, é certo que está no espírito dos princípios professados por muitos autores que, entretanto, a cada instante se contradizem fazendo a apoteose da poesia e da literatura.
Spencer chegou ao ponto de afirmar que tudo quanto é estético
tem por caráter ser inútil. E Letorneau, citando esta passagem, conquanto reconheça que nunca sentença mais rigorosa foi lavrada contra a poesia e as belas-artes, todavia não deixa de reconhecer que esta sentença é em grande parte verdadeira.
Há mesmo uma escola de poesia ou literatura, com a dominação de escola realista, concepção inconseqüente e grosseira que em vez de ser qualquer modo de compreender a poesia é, pelo contrário, a negação de toda a poesia, como de todas as artes, do mesmo modo que o positivismo é a negação de toda a filosofia. Nasceu uma semelhante escola do ponto de vista utilitário originado preocupação das necessidades materiais; mas é o que já houve de mais extravagante na ordem das produções intelectuais. Não obstante esta monstruosa extravagância tem sido propagada com entusiasmo e calor e tem representante em toda a parte.
A verdade é que numa concepção rigorosamente utilitária da sociedade, a poesia, como as belas-artes em geral, não pode ter uma explicação verdadeiramente racional das funções que exerce. Desde que a utilidade é elevada à categoria de princípio último, fica perfeitamente e definitivamente estabelecida a dogmática do egoísmo. O egoísmo torna-se então o princípio diretor e regulador da evolução social. Como pode, pois, ser salva a poesia? Ela não aumenta o conjunto dos conhecimentos, nem concorre para a submissão da força da natureza. Para que serve, pois? Para ornamentação do espírito? A utilidade repele essa ornamentação luminosa, porém infecunda. Para disciplina? A verdadeira disciplina intelectual é a ciência. Se são, pois, unicamente estas as considerações que se podem fazer em favor da poesia, pode-se desde logo estabelecer que ela não escapa incólume ante o terrível - quem vem lá – hodierno da ciência e da crítica.
RAIMUNDO FARIAS BRITO (1863-1917)
Nascido em São Benedito, bacharelou-se em Direito pela Faculdade do Recife, leciounou no Liceu do Ceará na Faculdade de Direito de Belém. Foi um dos maiores filósofos do Brasil, um dos fundadores da Academia Cearense de Letras, tendo sido, nas reformulações posteriores, promivido a patrono. Principais obras: A Filosofia como Atividade Permanete do Espírito Humano (1895), A Filosofia Moderna (1899), Evolução e Relatividade (1905) e as obras que formam a série Finalidade do Mundo: A Verdade como Regra das Ações (1905), A Base Física do Espírito (1912) e Mundo Superior (1914).

Friday, October 28, 2005

Gustavo Barroso


Santa
A Alberto de Oliveira
E eu? Cega, sozinha neste mundo de
Deus? Que há de ser de mim?
COELHO NETTO: Sertão

Novembro. Andava-se já em seca brava. As águas tinham fugido. Entre os arbustos ressequidos terreavam mouchões de felga quistosos e nus, de onde o vento levantava à tarde uma poeirada de oiro.
Aos solavancos duros, o meu cavalo fatigado descia a última rampa da serra do Pereiro. Pela lomba íngreme, marcada de antigas aluviões erodentes, aqui e ali pungam touceiras enfezadas de arbustos espinhosos. A estrada sarjava de vermelho a terra desnuda, sem fiapos de gramíneas, com esqueletos de árvores. Só muito alto, onde havia mais frescura, azulesciam matos. A planície erma do sertão enchia-se da nevoaça das queimadas, acinzentando-se com o cair do dia. Para o poente esbatia-se uma amarelidez de crepúsculo. Alto, o céu era cinzento, deserto e tranqüilo como a paisagem. Um parecia refletir o outro. Todos os tons que durante o dia o sol esbraseara abrandavam-se, desmereciam: eram cinzento-pérola as capoeiras abertas, branco-cinza as extensões queimadas, azuladas as serranias que fugiam no horizonte, empastadas de bistre e sépia as várzeas que se ermavam e que se confundiam à distância. Raros sons quebravam a uniformidade do silêncio. Mais raros vultos moviam-se na tristeza monótona do cenário.
Finda a ladeira esconsa, a terra estéril retalhava-se nos barracos das enxurradas antigas. Sombras adensavam-se, confundindo-se, nos anfractos das pedreiras. Às vezes, dominando o carrascal morto, dormitava na quietude do espaço uma canafístula sempre viva, decotada a foiçaços.
Detive-me numa volta do caminho, à porta duma choupana arrincoada, que se aninhava na orla da selva despida de folhas. O terreiro era espanado e limpo pela vassoura e pelo vento. Surgiam-lhe em torno, adoidadamente, grandes casas de cupim, dum amarelo de ocre. Escurecia. Luzeluziam pirilampos. Sopros ainda fracos do aracati refrescavam a calidez da soalheira passada, que se desprendia do solo maninho em emanações de mofo. Arejos mais fortes levantavam pó. Aquele vento do litoral que toda a tarde invadia o sertão pelo vale do rio Jaguaribe, chegava tarde por aquelas alturas. Era longa a sua viagem benéfica da costa às faldas do Pereiro.
Bradei à porta:
- Oh! de casa!
Apareceu uma cabocla forte e esperta, com dois filhinhos a se agarrarem nas dobras amplas de sua saia de algodão listrado. Rumorejou afável que desapeasse, prendesse o cavalo à tacaniça e entrasse.
- A casa é sua, moço.
Estava só com os filhos. Era noite, mas o marido ainda roncava pelos ermos, em busca das vacas moribundas nos rincões ásperos da serra, onde subiam, sequiosas, esfomeadas, migrando da planície estéril à cata de sombra, de comida e de água. Lá, nada também encontrando, morriam de inanição e de miséria. Às vezes os seus gemidos vinham até a casa, roucos, sinistros, pausados, numa distância de aflição, num soluçar de desesperança. Os gaguejos fracos dos bezerrinhos pareciam ate choro de crianças. Ouviam-nos o dia todo. À tarde diminuíam. De noite apagavam-se. Então guaxinins e raposas andavam a guaiar, sandejando pelas quebradas. Os pobrezinhos tinham acabado de sofrer.
Em setembro o vento levara as últimas folhas secas. Mas nas abas das serrotas acamavam-se as pastagens suculentas e amareladas. Era grande o cuidado com elas. Ficavam longe da estrada. Não havia perigo de fogo pelo descuido dum comboeiro fumador. No entanto, como por castigo, havia pegado fogo o pasto do Zacarias, meia légua adiante, e os carcarás, catando bichos grelhados no braseiro, trouxeram nas garras garranchos inflamados que deixaram cair no capinzal seco. O incêndio lavrou. Ficou destruído o último alimento do gado infeliz.
Agora por ali todo o solo estendia-se sáfaro, calcinado, negro, léguas e léguas. E a gente sentia, ao vê-lo, uma funda tristeza a subir do peito, uma ânsia, uma saudade de olhar grandes campinas muito verdes, com águas estremecidas, reluzindo.
Entrei na casinhola. O interior era mais que humilde. Presa ao tapume, a candeia de querosene oscilava. Sombras iam e vinham pelo teto enxalmado. Num raio de luz faiscava, às vezes, o bocal polido duma arma, pendurada às forquilhas bidentadas, ou palpitava em pingos brilhantes a pregaria grosseira duma mala de couro. A chaleira rumorava sobre uma trempe, entre labaredas desiguais. Estalavam garranchos ao fogo. Desprendiam-se centelhas, a espaços, em penachos e leques.
A mulher enxotou os filhos, bruscamente, para o quarto. Deu-me numa xícara de esmalte enodoado um pouco de café. Fui sorvendo-o a goles compassados. Ela encostou-se à ombreira do quarto em silêncio; e os caboclinhos vieram de novo agarrar-se-lhe às saias, curiosos, a espiar-me.
Fora já era noite fechada, escura como breu. Quase não se viam estrelas. As constelações apagavam-se, pestanejando. Fiz uma nova pergunta sobre a seca. A sertaneja suspirou e vagarosa, resmoendo aflições, descreveu-me toda a ferocidade da natureza e toda a valentia dos vaqueiros. "Deus até parece que não tem pena da gente", disse ela. Água, iam-na buscar a duas léguas, ladeira acima. Já haviam morrido as suas poucas cabeças de gado. As do patrão acabavam-se aos pares por dia. Andavam a comer a carne seca das ovelhas que tinham morto antes que a fome as levasse. Dia a dia a situação piorava. A luta já era desesperada. Os filhos do Joaquim Simeão, cansados de lutar sem proveito, tinham procurado o seu rumo. Estendeu o braço à toa como a indicar uma paragem longínqua, que mal entrevia na sua imaginativa rude, que mal podia compreender na curteza de suas idéias:
- Os Almazonas.
No terreiro riscou um cavalo. E o marido, um caboclo ossudo, alto, entrou, arrastando as esporas rudes, todo vestido de couro avermelhado, com as grossas costuras brancas de poeira.
A mulher explicou a minha presença. Sorriu hospitaleiro e bom, com um gesto largo de franqueza ostensiva. Foi tratar-me o cavalo. Era pouca a água, mas chegaria para o meu, cansado da viagem, e para o dele, tonto de varar a mataria garranchenta. Quase não tinha milho no paiol. O cercado, porém, guardava ainda um resto incolor de panasco, seco.
Ela começou a arranjar o "de comer". Novo silêncio encheu o copiar. Uma raposa vadia gaifonava ao longe, nos carrascais desertos.
O vaqueiro reapareceu. Sentamo-nos ao chão sobre um couro de boi e, calados, devoramos um alguidar de carne cozida n’água e sal, com pirão de farinha grossa. Os dentes às vezes rangiam, mastigando torrões de barro encontrados na farinha. Pela porta entrou, a fazer festas com a cauda troncha, os olhos verdes humildes e famintos, um cadelo esquelético. Acompanhava de perto, sofregamente, os ruídos todos da mastigação. Era o verdadeiro espectro da fome. Mas logo o vaqueiro ergueu o braço: Sai daí, Rompe-Nuvem! O mísero encolheu-se, levantou-se corcoveado e foi sentar-se mais adiante, à soleira, ofegando, com as riscas das costelas justalinheando-lhe os flancos murchos.
Tomamos café. O sertanejo dependurou minha rede a um canto da quadra. A mulher enrolou o couro, depois de o haver sacudido com força, e, raspando com a colher de estanho o alguidar de barro, deixou cair ao chão fiapos de carne, migalhas de pirão e ossinhos pequenos. O cão veio de rastos, encolhido e ávido, lambeu a argila demoradamente e ficou-se depois, para ali, a triturar os ossos nos dentes. De quando a quando soltava um rosnado lento advertência de estar disposto a defender o seu quinhão.
Na alcova, a cabocla cantarolava, ninando os dois filhos. Na sala, o vaqueiro remendava as véstias de capoeiro rasgadas nos espinhos unciformes dos arbustos maus que nem a seca matava. Saí ao alpendre e acendi o cachimbo, olhando a noite escura. Passou-se algum tempo. Depois, ao longe, surgiu uma luz que cortou a treva direita ao rancho, com vagar, oscilando. Vinham dois vultos, um dos quais trazia uma lanterna envidraçada; já no alpendre distingui-os bem. Eram uma velha acurvada e rusguenta, apoiando-se a um bastão, e uma criancinha loura e triste. Deram-me boa-noite e entraram na casa, pouco se demorando. Saíram. E de novo a luz foi oscilando, a apagar-se pela escuridão afora.
Chamei o vaqueiro e indaguei curioso do que andavam a fazer aqueles dois entes fracos por noite tão negra, quando chocalhavam cascavéis de tocaia e uivavam raposas insofridas, aos bandos, esfaimadas. Então ele contou uma melancólica história de dor, de martírio e de abnegação.
Era o mais avaro e o mais rico fazendeiro daquelas redondezas o velho Chico de Paula, que ao morrer deixara aquela velhinha, sua mulher, dona de grandes fazendas, oiros, lotes de bestas parideiras, boiadas incontáveis, currais cheios de miunças, além do sitio da serra que era um "condado", onde a maniçoba abundava nos recostos dos morros e dos altos paus d’arco baixavam as nervuras dos cipoais, como antenas enormes. Fora sempre brutal e ríspido, humilhando-a tanto quanto judiava com seus acostados e serviçais. Ela não tinha voz para cousa alguma. O negregado mal lhe dava os meios de subsistência, restringindo, cúpido, semana a semana as despesas domésticas. Ralhava com todos, enfezado, a cada momento. A sua morte foi um alívio e nessa ocasião a pobre D. Maria, sua única herdeira, logo pudera ajudar a pobreza que a seca fora grande e a fome muita. Dessas esmolas fez repetidas vezes. As crises mesmo lhe davam prejuízos fortes. Pouco se importava. Parecia querer espalhar em benefícios aquela fortuna reunida por maldades. Teve a mania de criar todas as crianças abandonadas da ribeira. Umas eram órfãs, outras orfanadas pela necessidade dos pais ocultarem vergonhas. Sua casa foi um asilo. Cresciam ali como filhos e ao casarem recebiam um pequeno dote. A mulher do vaqueiro era uma dessas enjeitadas.
E não fazia só isso. Quem precisasse, poderia bater à sua porta. Era servido. De sua ilimitada bondade os maus se aproveitavam até para a explorarem.
Criara umas doze pessoas e sua fama já percorria o sertão do Cariri. Todo o mundo dizia que era santa e essa crença arraigava-se dia a dia na alma sofredora dos roceiros.
Com os anos empobrecera aos poucos. Um incêndio levou-lhe a casa da fazenda. As últimas terras que possuía amaninharam-se ao abandono. Reduzida à miséria, morava agora numa palhoça que o vaqueiro construíra na várzea. Teimava em ficar lá, desprezando os convites de vir para a casa dele. Ia em oito anos que criava aquela menina dum louro de milho fanado, enjeitadinha, a última talvez. Tinha setenta e oito anos de caridade e amor. Não suportava mais nos olhos enevoados a ardência do sol. Era obrigada a sair de noite, a procurar víveres nas casas dos que alimentara durante largos anos.
Ao partir, deixei-lhe uma esmola e nunca mais esqueci aquele heróico vulto de mulher sertaneja, nobre, doce, abnegada, fazendo frente às calamidades terríveis do seu áspero meio, abroquelada na sua virtude excelsa e na sua alma desprendida, que valia por uma instituição forte de beneficência.
Tempos depois voltei àqueles lugares e na casa humilde do vaqueiro serviu-me água, vestida de luto, uma criança loura. Adivinhei naquela roupa de dó a morte da velhinha. O vaqueiro confirmou o meu presságio, dizendo-me que se finara placidamente, a sorrir, sem uma convulsão, sem um estertor, como soem morrer os justos e os santos. Até corria entre o povo que a terra não comeria o seu cadáver, preservadas as carnes mortais pela santidade eterna da sua alma...
GUSTAVO DODT BARROSO (1888-1959)
Nascido em Fortaleza, estudou na Faculdade de Direito do Ceará, mas bacharelou-se na do Rio de Janeiro, em 1911. Escritor dos mais prolífero, com mais de cem títulos catalogados nas mais diversas áreas, como História, Biografia, Arqueologia, Museologia, Economia, Folclore, Lexicografia, Literatura histórica, didática e infantil, Política, Memórias, Viagens, Teatro e Conto. Alguns de seus principais trabalhos: Terra de Sol (1912), A Guerra do Artigas (1930), A Guerra do Vidéo (1930), A Guerra do Rosas (1929), A Guerra do Flores (1929), A Guerra do Lopes (1929), Consulado da China (1940), Praias e Várzeas (1915), Alma Sertaneja (1923), O Santo do Brejo (1933) e História Secreta do Brasil (1937-38), em três partes. Adepto do movimento Integralista. Eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1923, foi dela duas vezes presidente.

Thursday, October 27, 2005

Clóvis Beviláqua


NA HELÊNIA

Nessa noite, Crobilo teve um sonho estranho que lhe pareceu uma revelação.
Estava sentado sob um frondoso plátano, em uma eminência de onde se avistava, a um lado, o Pireu com as suas cabanas de pescadores, seus vastos armazéns, suas extensas muralhas e os três portos. Mais além a ilha Egina, que Péricles chamara a belida do Pireu, e o mar, vasto e azul, cortado por vários navios garbosos, cujos remos fendiam as águas, unidos na distância, num compasso igual, semelhando grandes aves marinhas a agitar as asas em demorado vôo à flor das águas.
Sem que percebesse de onde viera, chega-se a ele Epicuro, com a mesma fisionomia sofredora e nobre, o mesmo olhar doce e suavemente melancólico, e os lábios encurvados pela mesma ironia fina que mais parecia eflúvio de uma alma que sofre do que desilusão de um espírito que tudo sondou para tudo saber. Estavam sós, Epicuro pousou-lhe a mão no ombro e falou, numa voz persuasiva e acariciante:
- Buscas o repouso e a felicidade. E onde julgas que esteja a felicidade, e onde pensas que se esconda a paz do espírito, que é doce como um fruto sazonado? No prazer? Na volúpia? No gozo fugitivo e vão dos sentidos? Aristipo e a escola cirenaica foram todos uns desvairados. Não afastes o prazer que te for deparado pelo mundo; mas colhe-o como quem colhe uma flor. Ele vem da natureza e foi ela que assim nos moldou a vida. Erigir porém a satisfação dos desejos materiais em princípio fundamental de conduta, em base da moral, é um pensamento sujo que tresanda a vinho. O prazer físico, se é descomedido, exaure deixa um ressaibo de fel; a volúpia contínua apaga o fogo da inteligência, centelha divina que nos destaca e eleva acima dos brutos e dos bárbaros.
- Mas a religião? balbuciou Crobilo dominado mais pelo tom das palavras do que mesmo pelo que elas significam.
- A religião? ... O filósofo teve um olhar mais condoído e uma ironia mais forte, porém uma doce ironia que não magoava. A religião? ... Não atormentes os deuses com as tuas preces insensatas. Efebos eternamente belos, eternamente jovens, afogados na ebriedade de um gozo ideal, não podemos sequer imaginar que eles se rebaixem a se imiscuir com a nossa vida mesquinha que dilaceram as paixões e as dúvidas. Serenos e despreocupados, eles vagam pelos intermúndios, enquanto o lento curso das coisas se desdobra imutável, impelido pela queda dos átomos em turbilhão.
- Mas a pátria?
- Bela e nobre coisa é, por certo, servir aos seus, ser útil à pátria. Mas teriam sido felizes, Aristides banido, Temístocles, refugiado entre os persas, Fócion, bebendo a cicuta preparada por aqueles mesmos a quem procurara servir, Demóstenes, suicidando-se no templo de Posêidon, na Caláia? ... Não te descoroçoem estes exemplos, e serve à tua pátria nobremente, como estiver em tuas forças; mas não suponhas que encontrarás aí a felicidade. O favor popular é uma fonte inesgotável de mágoas e dissabores. O povo é inconstante e cruel; sacrifica, em uivos de cólera, o ídolo que adorara de joelhos no dia anterior. Que mortal foi maus endeusado pelos atenienses, do que Demétrio? E, no entanto, que destino triste o seu!... Não procures o favor das turbas; segue impávido o teu caminho e deixa que a onda popular se espoje além, sem te arrastar no seu refluxo.
- E o que fazer? Onde beber, então, o gozo que as almas procuram sedentas? Onde a felicidade? Onde a paz do espírito?
- Há um vinho mais doce e mais delicado do que o que se extrai dos cachos da uva de Quio e que se bebe em taças lavradas. É a prática do bem, é a virtude, a qual nos dá o gozo no momento atual, que passa rápido, e no passado, que subsiste pela revisão do que fizemos. Ninguém pode ser feliz sem ser justo! Existe um favor mais cobiçável do que o da populaça de Atenas ou de qualquer outra cidade: é o da própria consciência e o da consciência dos que nos podem compreender!
Coloquemo-nos acima do vulgo, sem desprezá-lo vaidosamente.
Libertemo-nos de suas inquietações crudelíssimas e de seus temores infantis, criados pela ignorância; mas não procuremos arrancar-lhe as ilusões que lhe amenizam a existência, uma vez que não é possível iniciá-lo na religião da ciência, que tem as suas provações como as outras os seus mistérios.
Envolvidos no sendal sereno da ataraxia que nos dá a contemplação das leis universais da natureza grandiosa e vasta, da beleza ideal e da virtude, cortemos o cordão umbilical que nos prende ao mundo reduzido de uma pequena cidade helênica, e elevemos a vista mais ao largo, mais ao longe.
A suprema serenidade que só as almas superiores conhecem eis a felicidade tangível. O caminho que a ela nos conduz é essa necessidade faminta de conhecer o mecanismo da vida universal, aliada a essa outra necessidade de ser bom, de ser justo. Isto é a filosofia, é "a energia pela qual a razão conduz o homem à felicidade". A filosofia é um rio de águas claras e profundas, mas está longe, muito além, por trás de montes altíssimos, de florestas rebarbativas.
O filósofo calou-se. E nesse momento assumiu Telesipa, como se tivesse emergido do solo.
Tinha um sorriso vitorioso aberto em flor na flor dos lábios, e, arrepanhado um pouco a túnica que o vento do mar agitava, derramou a luz do seu olhar sobre as dúvidas tormentosas de Crobilo. Falou, radiosa:
- Não rebusques mais nem desesperes. A felicidade sou eu! É bem simples, poder crer: a felicidade sou eu. - E, envolta em uma nuvem diáfana, trescalando mirra, sorriu ainda, vitoriosamente.
O filósofo, envolvendo os dois jovens no mesmo olhar compassivo, acenou com a sua bela cabeça de pensador, aprovando:
- Amai-vos - disse - enquanto sois moços e a lira de vossa alma tem vibrações para essa incomparável ternura que transvasa do seres quando se infloram para o amor! Amai, dissolvei o vosso ser em ondas de afeto! Sim, é isso. É bem simples e é perfeitamente humano. Mas não esqueçais a linha reta, e, sempre com os olhos fitos no alto, procurando compreender a natureza e a vida, o real e o justo, segui o vosso caminho, unidos e felizes, desassombrados e inesitantes.



CLÓVIS BEVILÁQUA (1859-1944)
Nascido em Viçosa do Ceará, foi um dos maiores juristas brasileiros. Bacharel em Direito pela Faculdade do Recife, lá, enquanto estudando, participou da chamada "Escola do Recife", movimento intelectual importantíssimo nas últimas décadas do século XIX. Autor de diversas obras de Direito (especialmente no Civil), de filosofia, de contos e de crítica literária, sendo o seu maior legado o Código Civil de 1916, o primeiro elaborado para o País. Participou da Academia Francesa do Ceará, foi colaborado do jornal O Pão, da Padaria Espiritual, membro fundador da Academia Brasileira de Letras e patrono da Academia Cearense de Letras. Homenageado com seu nome pelo Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará.

Wednesday, October 26, 2005

Juvenal Galeno

Cajueiro Pequenino


Cajueiro pequenino,
Carregadinho de flor,
À sombra das tuas folhas
Venho cantar meu amor,
Acompanhado somente
Da brisa pelo rumor,
Cajueiro pequenino,
Carregadinho de flor.

Tu és um sonho querido
De minha vida infantil,
Desde esse dia... me lembro...
Era uma aurora de abril,
Por entre verdes ervinhas
Nasceste todo gentil,
Cajueiro pequenino,
Meu lindo sonho infantil.

Que prazer quando encontrei-te
Nascendo junto ao meu lar!
— Este é meu, este defendo,
Ninguém mo venha arrancar –
Bradei e logo cuidadoso,
Contente fui te alimpar,
Cajueiro pequenino,
Meu companheiro do lar.

Cresceste... se eu te faltasse,
Que de ti seria, irmão?
Afogado nestes matos,
Morto à sede no verão...
Tu que foste sempre enfermo
Aqui neste ingrato chão!
Cajueiro pequenino,
Que de ti seria, irmão?

Cresceste... crescemos ambos,
Nossa amizade também;
Eras tu o meu enlevo,
O meu afeto o teu bem;
Se tu sofrias... eu, triste,
Chorava como... ninguém!
Cajueiro pequenino,
Por mim sofrias também!

Quando em casa me batiam,
Contava-te o meu penar;
Tu calado me escutavas,
Pois não podias falar;
Mas no teu semblante, amigo,
Mostravas grande pesar,
Cajueiro pequenino,
Nas horas do meu penar!

Após as dores... me vias
Brincando ledo e feliz
O-tempo-será e outros
Brinquedos que eu tanto quis!
Depois cismando a teu lado
Em muito verso que fiz...
Cajueiro pequenino,
Me vias brincar feliz!

Mas um dia... me ausentaram. .
Fui obrigado... parti!
Chorando beijei-te as folhas. . .
Quanta saudade senti!
Fui-me longe... muitos anos
Ausente pensei em ti...
Cajueiro pequenino,
Quando obrigado parti!

Agora volto, e te encontro
Carregadinho de flor!
Mas ainda tão pequeno,
Com muito mato ao redor...
Coitadinho, não cresceste
Por falta do meu amor,
Cajueiro pequenino,
Carregadinho de flor.



JUVENAL GALENO da Costa e Silva (1836-1931)
Poeta e folclorista, tidocomo "o pioneiro do folclore no Nordeste". Sua poesia foi romântica, porém seguiu uma linha mais popular, com apego às tradições sertanejas e praianas. Mário Linhares e Antônio Sales apontam seu primeiro livro, Prelúdios Poéticos (1856), como marco inicial da literatura cearense. Membro fundador do Instituto do Ceará e patrono da cadeira n° 23 da Academia Cearense de Letras, mais tarde ocupada por sua filha, Henriqueta Galeno.

Eduardo Campos


O Enterro ou A Casa Sem Cão


A mulher, à pressa, já segurava a bolsa para sair, depois de verificar atenta se o fogão a gás não ficara com alguma boca acesa; e se voltou para o pai idoso, recomendando:
Estou de partida. Tenha cuidado na casa. Demoro pouco.
Ia acrescentar que por urgente necessidade tinha de se ausentar, pois precisava ganhar uns trocados a mais para dobrar a resistência do bodegueiro sem mais querer fiar... Parou. O outro dizia-lhe decidido:
– Vou sair também. Cadê o meu paletó?
Ela estacou surpresa:
– Sair? sair pra onde?
A voz do homem soou enérgica e resoluta:
– Você estava na cozinha, nem prestou atenção. Deu a notícia no rádio...
– Que notícia, pai?
– Você conhece, não... Era meu grande amigo. Morreu. Coitado do Belisário.
– Tão importante assim para merecer registro em programa de rádio? Não, papai, o senhor se confundiu...
Ele insistiu, a cobrar:
– Cadê o meu paletó?!
Seu paletó foi comido pelas traças... Tinha virado peça de museu.
Me parecia ainda bom de uso. A última vez...
Ela interrompeu-o:
– Isso foi há doze anos, quando faleceu o vizinho.
– Sei disso não. Bom, só sei que vou ao enterro do meu amigo Belisário. Sem paletó. Todo mundo vai reparar. É que nunca vesti silaque em cerimônia social.
– Papai, não quero teimar, mas tudo não passa de um equívoco. O locutor...
– ... o locutor falou bem duas vezes o nome dele, o endereço, deu tudo! Meu amigão! E você não sabe...
– Não sabe o quê?
– Tínhamos um pacto. Ele jurou, eu jurei também: se um dos dois morresse primeiro, o que ficasse estaria obrigado a ir ao enterro, estivesse onde estivesse. Assim vai ser... Deus o chamou em primeiro lugar, tocando a mim, agora, cumprir a palavra empenhada.
– Que palavra empenhada! Isso passou! E por favor vá sossegar tenho de ganhar o meu dinheiro.
– Ah, então é desse modo? Muito bem! Não causa admiração que o mundo esteja – me deixe dizer um nome feio – nessa esculhambação de hoje. Não! Sou de ontem, de tempo em que as pessoas possuíam palavra, cumpriam o trato. Cedia o lugar de sentar nos bondes a uma dama, ajudava a idosos...
– Papai, escute bem. Os seus netos já foram trabalhar, e eu só vou sair por extrema necessidade. Dessa forma o senhor não pode comparecer ao sepultamento do seu grande amigo. Por isso, é melhor se contentar com uma oração...
– Oração é coisa de protestante. Eu rezo.
– Pois então reze. Dá tudo igual. Contanto que fique em casa. A nossa, repare, não pode ficar sem ninguém, principalmente com a onda de ladrões solta no bairro...
– ... ladrões aqui ?!
– É onde dá mais.
Ele ficou pensativo. Depois de um momento, lembrou:
– Deixe o cachorro botando sentido. Você pode ir pegar os seus trocados, como falou, e eu sigo para cumprir o meu acordo...Paciente, ela explicou:
– O senhor deve estar esquecendo as coisas... O Japi morreu... morreu de velhice. E nós não tivemos condições de adquirir outro animal de guardar a casa.
– Agora deu ruim! Eu não posso desfazer o trato com o falecido. O Belisário se estivesse em meu lugar, com paletó ou sem paletó ia acompanhar o meu enterro. Foi o melhor amigo que tive, marido exemplar.
Ela moveu a cabeça, aborrecida:
– E tem mais, papai, o dinheiro que vou receber é importante para pagar a mercearia. De outro jeito, se duvidar, vamos ter de passar fome... E mesmo...
– Mesmo o quê?
– O senhor, aos oitenta, não tem mais condições para sair de casa, desacompanhado.
– Minha companhia é Deus. Me considero forte, me levanto sozinho de noite para ir ao banheiro... e...
– Mas não pode.
– Alugo um menino do vizinho. Ainda tenho uma pontinha de dinheiro da aposentadoria.
– Compreenda, papai! A família do tal Belisário na certa nem sabe se o senhor existe. Bem, a hora está passando e preciso, agora digo como o senhor, preciso cumprir meu trato.
– Meu Deus, a que ponto cheguei na vida! Minha própria filha quer que eu fique desmoralizado. Contando não tem quem acredite!
– Ela tornou a insistir em tom amável:
– Papai, vá sentar-se na sua cadeira de vime, perto da porta... Prometo, prometo de verdade! Vou ficar atenta aos jornais! Podemos ir juntos à missa de sétimo dia.
– Missa de sétimo dia não é enterro. Não aceito esse tipo de solução.
E com convicção, exaltando-se:
– Vou ao enterro, VOU!
– Papai...
– VOU, VOU!
Foi só um instante, tempo em que ela apreensiva consultou o relógio, a ver que horas davam, e decidiu:
– Não tem acordo, não tem paletó, não tem enterro! Vá sentar na cadeira como estou mandando, que preciso ganhar o meu dinheiro. É isso!
– Deus castiga a quem maltrata os pais.
– É sentar bem direitinho e não deixar a casa só. Os ladrões, repito, andam por aí. Se duvidar vão entrar aqui e carregar o seu rádio. Vá, vá, vá, me obedeça!
Fê-lo arriar-se na cadeira de vime, nervosa, considerando que se não partisse quanto antes não teria como passar a roupa, tarefa a que se obrigara de véspera.
– Não deixe ninguém entrar. Ninguém mesmo!
Ele esteve para altear o tom da voz e protestar mais uma vez, chutar os móveis da sala, gritar palavrão, chorar, até chorar...
Mas se reconheceu trêmulo, esmorecido, e na realidade sucumbido por não poder, como prometera, honrar o compromisso com o Belisário.
E se deixou ficar batendo o pé no chão, perdidamente magoado.
Dolorosamente cão.



EDUARDO CAMPOS (1923)

Natural de Guaiúba, bacharelou-se em Direito pela Faculdade de Direito do Ceará em 1948. Jornalista, contista, romancista, teatrólogo, ensaísta, folclorista e memorialista. Membro do Grupo Clã, do Instituto do Ceará e da Academia Cearense de Letras, da qual foi presidente. Suas principais obras são O Chão dos Mortos (1974), A Véspera do Dilúvio (1968), romances; O Abutre e Outras Estórias (1968), O Tropel das Coisas (1970), Dia da Caça (1980), contos; O Demônio e a Rosa (1948) O Morro e o Ouro (1965), A Rosa do Lagamar (1965), teatro.

Gerardo Mello Mourão


Iam Caindo


Iam caindo: à esquerda e à direita iam caindo;
Alexandre e Francisco, meus bisavós tombaram,
o primeiro com sua farda de gala, seus botões de ouro
e sua patente de coronel
e o outro com sua barba nunca mais alisada e sua
bengala
de castão de ouro.

Antes, caíam hierárquicos e cronológicos:
Manuel Martins Chaves na prisão do Limoeiro,
Ana, Eufrosina e Úrsula Mourão, da Canabrava dos
Mourões,
em suas camarinhas cheias de santos,
Antônio, com seus bordados de general nos campos do
Paraguai,
um picado de cobra, outro sangrado a punhal, outro
varado à bala, outro
de maleita,
à esquerda e à direita foram todos caindo,
primeiro os que já eram lenda na memória dos velhos,
depois os avós de meus avós,
porque antes tombavam hierárquicos e cronológicos.

Foi assim que tombou, ao lado de seu rifle,
o Coronel José de Barros Mello, chamado "O
Cascavel", meu tetravô,
e depois o Major Galdino, entre seu bacamarte e suas
gaiolas de pássaros, depois, meu outro avô, o capitão de
cenho espesso sobre a tribo
ao talhe de seu tronco frondejando
a cabeça de Mellos e Mourões.

A esquerda e à direita iam tombando,

Úrsula, Francisca e tantas outras,
até cair meu pai.

Depois, começou a romper-se a ordenação da morte
e tombavam os tios e as crianças:
Etelberto, com seus negros cabelos lisos,
Raimundo prometera devolver à terra o que da terra
houvera e tombou nela;
Elisa, Elvina e tu,
com teus oito anos e tua cabeça castanha;
tombaram um por um: Ignácia e Ladislau viveram cem
anos e também morreram; tombou Quintino e nunca
mais
pela estrada de Águas Belas alazão levará
coronel tão galante e nunca mais na lua
da sela clavinote
tão certeiro;
tombou
Quintino e antes dele porque a morte ia deixando de ser
hierárquica e cronológica tombou no Maranhão
Francisco apunhalado.

A direita e à esquerda iam caindo:
Hermenegildo, chefe político e farmacêutico no distrito
do Livramento,
ainda teve forças para se erguer, beber uma garrafa de
aguardente, destruir a farmácia e escrever ao meu avô:
"Compadre, vou morrer, os remédios não valem nada
quando chega a hora;
mando-lhe aquele relógio Patek que você aprecia e a
corrente do mesmo,
com dois patacões de ouro. Adeus, compadre, Deus
o guarde com os seus,
do primo ass, Hermenegildo".

Outros tombaram sem carta e sem notícia:

meu tio e padrinho Antônio Ribeiro deu uma surra no
capitão delegado de Polícia
e desde a queda do Acioly desapareceu para sempre,
como Raimundo Mourão, tombado a tiros num seringal
do Amazonas:
tinha sessenta contos no bolso, surrara todos os
barraqueiros
e ganhara num sete de ouros
o dinheiro e as mulheres do cabaret: pois morreu, com
sua chibata na mão, com seus sessenta contos e com suas mulheres,
macho e inquebrável tombou.

À esquerda e à direita iam caindo:
Manuel
Mourão que registrara em seu nome todas as terras do
cartório de Ipueiras,
dorme nelas:
Tobias não tinha terra nenhuma
e matava bois no açougue e vivia disso,
tombou como um de seus bois;
à esquerda e à direita iam caindo
homens e mulheres: Tabajara, pai de Araci, Potiguara e
Tupinambá,
fabricava aguardente e não bebia - morreu abstêmio,
mas morreu;
o Major Borete Mourão, da Canabrava dos Mourões,
destilava a sua no próprio fígado — morreu bêbado,
mas morreu;
e Dondon e Cotinha e Missanta Mourão, senhora do
Engenho Baixa Verde
e Gilberto e Toínho Mourão e as primas que morriam
de parto e pariam filhos
também destinados a cair um dia,
foram caindo todos, à esquerda e à direita.
E agora sei: não apenas os de meu sangue iam caindo,
pois onde estão José Bento
e Sinhá e o Coronel Dédo Catunda?
Onde está o caboclo Antônio Pixuna,
com suas mandíbulas que varavam no dente uma cana
caiana?

Foram caindo todos: à direita e à esquerda e em todas
as cidades
Deolindo assassinado por Chico Monte em Sobral,
o velho Duíno em Minas Gerais, onde
também tombaram outros, Vicente
e sua mulher e Fernando no Espírito Santo e em Porto
Alegre,
com a pensão que lhe dera o Governo,
a filha de Antônio, general e herói da guerra do
Paraguai, comprava a sepultura,
pois
sabia que ia tombar, como tombou:
e em toda parte e em todo tempo, todos,
Bela, Manrica, Sinsa, Torquato, Zezé, Nazária, Aprígio
e Waldomiro,
Ignácio e Mariana e Atanagildo,
à esquerda e à direita iam caindo.

E ainda os que encontrei noutros caminhos
também foram tombando: esta é a bengala do Coronel
Carvalhinho,
pai do Senador e avô de Léa: tombou sem ela e
Geraldino
apagou seus grandes olhos e o jovem sacerdote
barroco
Caetano
partiu-se
o grande Cristo de bronze se abatendo sobre
a jarra de porcelana azul outrora azul do altar.

E tu mesma caíste, eu que te havia por
endereço do coração (e ainda cantarei de ti, que agora
tenho apenas o espanto
da implacável derrubada
em que todos vão tombando em toda parte).

Em minha casa, em minha rua e na cidade e no país dos

Mourões onde eram
clavinotes
e nos outros países além dos mares,
o velho Nicolau, pai de Gofredo,
quem sabe Cuca, a tia de Raul,
e em Milão e em Berlim e na Provença
foram caindo.

Apalpa, meu amor, meu rosto apalpa,
não tombei:
sou eu.
Como venho dos mortos nem eu sei,
mas sei que na partilha me tocou
a herança de sobreviver;
vou devorando a terra com meus olhos
que a terra não comeu, a terra
que comeu tantos olhos e da qual
os meus hoje se nutrem.

Apalpa, meu amor, meu corpo inteiro,
sou macho e forte e em meus ombros de touro
porque não te levar na madrugada
e atravessar contigo as ruas desertas e as ruínas e as
cidades
cobertas de hera onde
à esquerda e à direita eles tombaram e à beira
de um riacho ver teu ventre
crescer e irem surgindo
já de mãos dadas, já de pés em dança
rapazes e raparigas e a cantiga
de roda e a flauta de Mársyas e o ritmo
de tornozelos e ancas que Sextus Propertius foi o
primeiro
a introduzir na Itália e trouxe da Grécia para a Itália
e Ezra para Idaho
e das ruínas das cidades ver
surgirem os pastos e os pastores
da pedra das palavras?

Teu poeta e teu macho te carrega nos ombros
e à esquerda e à direita onde tombavam antes,
como um mágico de uma cartola irei tirando
de teu ventre inesgotável
os que não mais cairão, os que se irão
à esquerda e à direita incorporando. Pois
apenas esperavas a chegada de teu macho;
diz agora: era assim que o querias,
o vencedor da morte, o que enrijou os músculos
almoçando e jantando a medula dos homens e das fêmeas
que à sua esquerda e à sua direita iam caindo,
era assim que o querias
o que venceu a Dor?

Sou eu, amor, apalpa agora

minha boca pronta ao riso alegre,
minhas bochechas, apalpa-me
o sexo frondoso e fértil
e escancha as tuas pernas sobre o meu pescoço:
é tempo.

"Aos oito dias do mês de Janeiro do ano da
graça de Nosso
Senhor Jesus Cristo, de mil e novecentos
e dezessete,
eu, Manuel Guilhermino Moreira, recebi em meu
cartório o
Senhor Capitão José Ribeiro Mello que,
acompanhado das
testemunhas abaixo, declarou o nascimento
hoje, a uma
hora da madrugada, em sua casa, à Rua Padre
Feitosa, nesta
Vila de Ipueiras, de seu neto, o Inocente
Gerardo Majella,
do sexo masculino", etc.

E aqui restei: não venho
introduzir a dança na Itália,
trazer a dança da Grécia para a Itália
ou para qualquer outra terra de Europa:
sou o inocente do sexo masculino e venho
do país dos Mourões
comunicar-te a inocência e o pênis
erguido em lírio
vertical e puro sob os céus da Etrúria,
sob os céus da Toscana, às margens do Arno
e junto de Fiesole e San Minniato, sobre
os campos de Florença como o lírio
que deu nome à cidade e com que o rei de França
agraciou
as armas da cidade.

Ao pênis de ouro que se erguer do lírio,

a rosa de teu ventre se abrirá,
e onde o touro pisar no chão dorido,
a rosa de teu ventre se abrirá,
e onde o lombo do touro se reclinar contigo,
a rosa de teu ventre se abrirá
ao pênis de ouro que se erguer do lírio
e der nome às cidades e agraciar
as armas das cidades.

Wovon kommen Sie?

Jawohl, Fräulein,
na noite em que eu chegar
hás de ver tua aldeia renana
acender nas alcovas a alfazema antiga.
Wovon kommen Sie?
Mas da alfazema e tua aldeia
me suspeita há séculos:
esperava por mim a rapariga
que acendia os olhos e a lanterna de ferro
sobre o portal da Hospedaria
"Ao Cavaleiro de Koenigswinter":
eu era sugerido às raparigas
esperando a noite e quanta vez
sonharam distinguir-me na lonjura
entre as tulipas e o trigo e as espumas do Reno e luar
dele
sugerido
o süddeutsche Nacht!
o Heidelberge Nacht!
quem sabe eu chegaria
a bordo de urna brisa,
de uma folha de outono,
moreno
e torneado ao sopro
daquele tocador de flauta de louça
à porta do castelo de Brühl.

É certo que outros tentaram chegar antes de mim,

mas não me confundiste com eles;
de outros — nem os conheceste nem te conheceram,
o velho gangster não montava um cavalo do Texas:
na garupa da cadeira de rodas grunhiu:
"nossa fronteira está no Reno";
Beethoven surdo em sua casa de Bonngasse
ergueu-se e ergueu
ao ouvido sagrado o corno acústico
e o uivo do bárbaro não era
nem seu nome será em nosso idílio.
O nome dele, sim; veio de Hailey, Idaho, U.S.A.,
a 30 de outubro de 1885
e em seus ombros, amada, partirias:
era belo demais e foste tu
que rendida a seus pés deste a garupa
e o raptado raptor — ó delícias de Cápua —
divino gigolô lambendo os seios
da deusa ao fim do outono,
nas mãos do Pan de Idaho
reencontra o verão ao céu toscano,
Rapallo azul e a primavera à voz
do Pan de Idaho:
e o que te pudera arrastar às ilhas puras
embala-se contigo en los Cantares
dolci canti pisani in blood and blue
e a minha rede, a rede
do filho dos Mourões
entre a torre de Pisa e a de Giotto
sopro de campanile se balança
il nostro Cavazere fú:
e ali virás para a última sesta latina e onde
o lombo do touro galopar contigo
a rosa de teu ventre se abrirá
ao pênis de ouro que se erguer do lírio
e der nome às cidades e agraciar
as armas das cidades.

O Abendland, Abendländische

Elegie!
Velho profeta alemão, vidente de olhos cinzentas,
teus olhos cinza em cinza desmanchados,
toldam de cinza a paisagem:
olha a nua banhista, esverdeadas peras,
olha a dança, olha
o elegíaco nada, o nada
de elegias e à madrugada
entre as virilhas
olha amanhecer o macho:
sou eu e em meu louvor
maduram-se laranjas e ananases,
em meu louvor
as ondas bailam no oceano e sob
a verde umbrela dos coqueiros
Passo de Carnaragibe,
os cocos se arredondam
em meu louvor
e os cantadores na feira de São Gonçalo dos Mourões,
da Canabrava dos Mourões
e os cegos e os videntes e o gitano andaluz
entre o Atlântico e a montanha empreendem na viola
a minha louvação:
e Hans Carossa, na aldeia hamburguesa,
o último hálito sopra dos olhos a última cinza,
compõe no próprio rosto a própria morte
em meu louvor.

E meus olhos

assíduos a defuntos como a vivos
começam a apalpar-vos:
quem será testemunha senão vós
de partida e chegada?
E que sou eu senão
a celebração de meu rosto
e que é meu rosto senão
a beleza que o amor talhara nalguns olhos?

Sempre os deuses precisam de um lugar e de uma companhia:

assim eu sou:
é sobre a terra de meu pai que me levanto agora
e a tantos
que à esquerda e à direita lhe caíram,
eu os chamo e suplico:
e altar e coro se incorporem
e assim
eu sou:
celebrado celebro dia e noite
a terra e as águas e as pessoas
e assim
eu sou.



GERARDO MELLO MOURÃO (1917)

Poeta e romancista nascido em Ipueiras. Adepto do Integralismo, passou seis anos preso, chegando a ser condenado à morte por ter cometido atentado contra Getúlio Vargas, sendo perdoado graças ao apelo do escritor francês Albert Camus, de quem era amigo e tradutor. Fluente em nove lígnuas, traduziu em todas elas, destacando-se o grego e o chinês. Foi Deputado Federal por Alagoas. Exilado na Ditadura Militar na China. Em 1979, tornou-se o único brasileiro a ter sido indicado ao Nobel de Literatura. Escreveu, dentre outros, No País dos Mourões (1963), Peripécia de Gerardo (1972), Rastro de Apolo (1977), que formam a trilogia Os Peães, Invenção do Mar (1999), vencedor do Prêmio Jabuti, além do romance O Valete de Espadas, considerado revolucionário do gênero.

Monday, October 24, 2005

Moreira Campos


O Perigrino
Chão rude, áspero, mais de pedregulhos. Um que ou­tro bode ou cabra nas escarpas. O vento e os redemoinhos de folhas secas. Sobre os lajedos, ao meio-dia, modorra­vam lagartos. Os casebres em distância de léguas. Seres em farrapos, as calças dos homens em tiras dos joelhos para baixo, olho da enxada ao ombro. As mulheres mal podendo apresentar-se: os restos de roupa remendados não cobriam bem as vergonhas. Esse o pudor com que elas se entremostravam, escondidas no umbral da porta para ser­vir a caneca d'água, moringa na mão, olhos em terra. Nesse mundo Belarmino lavrava o roçado onde possível: o veio d'água, o poço barrento, que os músculos rijos aprofundavam no verão maior. Trabalhava o roçado em companhia do filho, até o dia em que a cobra, em mu­dança de pele, cega, muito veneno nas presas, picou o rapaz perto do buraco do antigo formigueiro sob a oitici­ca, única mancha permanentemente verde naquele mundo de cinzas.
O garrote de tira de pano no tornozelo, onde o beiço da pele já crescia duro e roxo. A vista empanada, quase sem luz, o delírio no fundo da tipóia:
- Água.
O ferro em brasa, que a própria mulher do filho trou­
xe da trempe de tijolos na cozinha. O gemido, contorções do corpo. A pele de fumo voltou a cobrir a ferida. Morreu três horas depois. Longe os vizinhos. Légua e meia o mais próximo. Belarmino teve de ir até lá (o cachorro enrolava­se no chão sob a tipóia do morto). Trouxe outros seres em molambos e grunhidos. E a marcha fúnebre - tipóia os­cilante presa à estaca de sabiá - se fez em direção ao distante arruado, onde havia a capela e o telheiro abatido do mercado.
No mais, a solidão da noite e dos seres. A viúva­menina, sem lágrimas. Duro mundo, carente de umidades. Muitas lições de renúncia. Tão trabalhados todos como a escarpa fendida e crestada pelo tempo, por onde subiam bodes e cabras.
- Ahn?
- Ô.
Eram as palavras, na noite que se comprimia, se fecha­va, vinda dos horizontes, da ramaria seca, de onde voavam bacuraus. Da folhagem do imbuzeiro chegava o rasgo da coruja, sem que o mau agouro espantasse mais. Apenas o cachorro erguia as orelhas, consultava o imbuzeiro e latia, insistente.
- Te cala, bicho!
O menino chorava no berço de varas. A viúva-menina
enfadava-se. Erguia-se, limpava com a mão o cisco ligado aos molambos do vestido (a nudez moça e magra contra a chama da trempe na cozinha ou à luz do dia) e servia o mingau de farinha ao filho.
Continuou a levar ao roçado o prato de comida ao sogro, naquele tamanho meio-dia, a colher de latão de tra­vés no amarrado do pano. O cachorro a acompanhava, des­viando-se pelas veredas: o faro de um que outro preá, mais presente, em pulsações de narinas, no cair da tarde. Belar­mino fincava a enxada no barro. Voltava a correr o indica­dor na testa para livrar-se do suor. Cuspia cuspo grosso. Deslocava-se do canto da boca e punha na pedra a masca de fumo. Sentava-se, benzia-se e iniciava o almoço.
Palavras poucas. Mais os pressentimentos e a com­preensão das duras coisas do mundo. Tanto que ela não se assustou quando ele um dia pousou a mão áspera, de mui­tos calos, um casco, sobre a sua coxa magra. Antes deu-se, sem espanto. Um objeto. Sabia que os olhos dele já lhe varavam o vestido ralo à luz da trempe ou do dia. Entre­gou-se à sombra do oitizeiro, forrando-se com o próprio pano em que envolvia os pratos.
O cachorro, apoiado nas patas traseiras, orelhas sem­pre erguidas, foi a única testemunha, sem contar o anum, que teve vôo rasteiro de uma estaca para outra da cerca, ou o lagarto que correu entre folhas secas.
Ela pôs barriga, apareceram as olheiras. A falta de ar já não lhe permitia levar a comida ao roçado. Belarmino valia-se da própria trempe de tijolos sob o mesmo oitizeiro.
A notícia correu de boca em boca, de légua em légua, ouvidos apurados. Uma velha benzeu-se. No nono mês, o próprio Belarmino lhe fez o parto, panela d'água fervente na trempe da cozinha, os molambos molhados. O umbigo do filho ficou crescido pelo corte sem arte. E assim, de grande umbigo, ele começava a engatinhar no chão de bar­ro, o meio irmão já firme nas pernas, o volume da barriga (não perdia o vício de comer barro). Riam os dois, o cachor­ro entre eles brincando de esconder-se, tudo menino.
Um dia, bateu à porta do casebre o Peregrino. Grande chapéu de palha, o camisolão com o cordão de São Francis­co, as alpercatas e o cajado. Nos tornozelos, grudado, o pódas longas estradas. Pregava a Bíblia, os ensinamentos de Deus, em febre de vozeirão e chamas do inferno. As loucuras. A grande barba negra, partida ao meio, tremia. Já trazia notícia daquela mancebia e incesto.
Baixou os olhos diante do vestido ralo da viúva-meni­na, que já se protegia no umbral da porta. Viu todos: Belar­mino, o menino mais crescido, o filho do incesto, que enga­tinhava e ria sem dentes, o grande umbigo. Pediu pousada, que lhe foi dada na esteira de palha da sala. A noite caiu. Os mesmos seres sem palavras. Mais, em tom de voz e luta com as trevas, as andanças do Peregrino, o mundo de chão que lhe comera as sandálias.
- Este mundo de meu Deus! - dizia, abrangendo o todo num grande gesto.
Não teve recriminações bíblicas. Cessaram ali as cha­mas do pecado, das condenações eternas. Apagou-se o fogo do inferno. Talvez tivesse tido a intuição de que a palavra de Deus era pequena ou grande demais para compreender a necessidade e a solidão. A mão cabeluda, de unhas sujas, voltou a agradar a cabeça dos meninos. Agradeceu a dor­mida e o alimento. Apoiou-se ao cajado, e as suas sandálias voltaram a palmilhar os caminhos do mundo.
José Maria MOREIRA CAMPOS (1914-1994)
Um dos maiores contistas brasileiros. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Ceará (1946) e em Letras pela antiga Faculdade Católica de Filosofia do Ceará(1967), foi professor de Língua Portuguesa da UFC . Membro do Grupo Clã, da Academia Cearense de Letras e da Academia Cearense de Língua Portuguesa. Publicou os livros Vidas Marginais (1949), Portas Fechadas (1957), As Vozes do Morto (1963), O Puxador de Terços (1969), Os 12 Parafusos (1978), A Grande Mosca no Copo de Leite (1985) e Dizem que os Cães Vêem Coisas (1987), de contos, e Momentos (1976), de poesia. É pai da autora Natércia Campos, de quem trataremos, certamente, mais tarde.

Membros da ACL

Aqui os membros da Academia Cearense de Letras, atualizados.

Cadeira n° 1 - Patrono ADOLFO CAMINHA
Ocupantes: Alf. Castro - Ermínio de Araújo - Sidney Neto - Sânzio de Azevedo.
Cadeira n° 2 - Patrono ÁLVARO MARTINS
Ocupantes: Alba Valdez - Luís Sucupira – Batista de Lima
Cadeira n° 3 - Patrono ANTÔNIO AUGUSTO
Ocupantes: J. J. Pontes Vieira - Antonio Martins Filho – Carlos Augusto Viana
Cadeira n° 4 - Patrono ANTÔNIO BEZERRA
Ocupantes: Otávio Lôbo - Antônio Furtado - Raimundo Girão - ­Mílton Dias - Joaryvar Macedo - José Murilo Martins.
Cadeira n° 5 - Patrono PÁPI JÚNIOR.
Ocupantes: Epifânio Leite - Fran Martins – Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes.
Cadeira n° 6 - Patrono ANTÔNIO POMPEU.
Ocupantes: Tomás Pompeu Sobrinho - F. Alves de Andrade – Natércia Campos – Virgílio Maia.
Cadeira n° 7 - Patrono CLÓVIS BEVILÁQUA.
Ocupantes: Mário Linhares - Nertan Macedo - Marly Vasconcelos.
Cadeira n° 8 - Patrono DOMINGOS OLÍMPIO.
Ocupantes: Fernandes Távora - Aderbal Sales - Horácio Dídimo.
Cadeira n° 9 - Patrono FAUSTO BARRETO.
Ocupantes: Tomás Pompeu Sobrinho - Carvalho Júnior - ­Alencar Matos - João Clímaco Bezerra.
Cadeira n° 10 - Patrono PADRE MORORÓ.
Ocupantes: Demócrito Rocha - Abelardo F. Montenegro.
Cadeira n° 11 - Patrono BARÃO DE STUDART.
Ocupantes: Joaquim Alves - José Valdivino - Dimas Macedo.
Cadeira n° 12 - Patrono HERÁCLlTO GRAÇA.
Ocupantes: Ferreira dos Santos - Natanael Cortez - J. C. Alencar Araripe.
Cadeira n° 13 - Patrono D. JERÔNIMO TOMÉ DA SILVA.
Ocupantes: Padre Misael Gomes - Ribeiro Ramos – Pe. Francisco Manfredo Tomás Ramos
Cadeira n° 14 - Patrono JOÃO BRÍGIDO.
Ocupantes:Antônio Teodorico - Jáder de Carvalho - Barros Pinho.
Cadeira n° 15 - Patrono CAPISTRANO DE ABREU.
Ocupantes: Válter Pompeu - Braga Montenegro - Padre F. Sadoc de Araújo.
Cadeira n° 16 - Patrono FRANKLlN TÁVORA.
Ocupantes: Leonardo Mota - Joel Linhares - Newton Gonçalves – Maria Beatriz Rosário Alcântara.
Cadeira n° 17 - Patrono JOAQUIM CATUNDA.
Ocupantes: Antônio Augusto - Renato Braga - Paulo Bonavides.
Cadeira n° 18 - Patrono MOURA BRASIL.
Ocupantes:Otávio Lôbo - Antônio Girão Barroso - Geraldo Fontenelle – Ângela Gutiérrez.
Cadeira n° 19 - Patrono JOSÉ ALBANO.
Ocupantes: Martinz de Aguiar - Mozart Soriano Aderaldo – Juarez Leitão.
Cadeira n° 20 - Patrono LlBERATO BARROSO.
Ocupantes: Antonino Fontenele - Clodoaldo Pinto - Cid Sabóia de Carvalho.
Cadeira n° 21 - Patrono JOSÉ DE ALENCAR.
Ocupantes: Justiniano de Serpa - Antônio Sales - Filgueiras Lima ­- Raimundo Girão - Osmundo Pontes – Regine Limaverde.
Cadeira n° 22 - Patrono JUSTINIANO DE SERPA.
Ocupantes: Leiria de Andrade - Alba Valdez - Eduardo Campos.
Cadeira n° 23 - Patrono JUVENAL GALENO.
Ocupantes: Henriqueta Galeno - Florival Seraine – Luciano Maia.
Cadeira n° 24 - Patrono LÍVIO BARRETO.
Ocupantes: Sales Campos - Elias Mallmann - Gastão Justa - Pedro Paulo Montenegro.
Cadeira n° 25 - Patrono OLIVEIRA PAIVA.
Ocupantes: Pápi Júnior - Carlyle Martins - Pedro Henrique Saraiva Leão.
Cadeira n° 26 - Patrono MANUEL SOARES DA SILVA BEZERRA.
Ocupantes: Andrade Furtado - Otacílio de Azevedo - Lúcio Alcântara.
Cadeira n° 27 - Patrono SORIANO DE ALBUQUERQUE.
Ocupantes: Teodoro Cabral - Adonias Lima - Durval Aires ­ - César Barros Leal.
Cadeira n° 28 - Patrono MÁRIO DA SILVEIRA
Ocupantes: Júlio Maciel - João Jacques – Giselda Medeiros.
Cadeira n° 29 - Patrono PAULlNO NOGUEIRA.
Ocupantes: Barão de Studart - Carlos Studart Filho - Itamar Espíndola – José Costa Matos.
Cadeira n° 30 - Patrono ROCHA LIMA.
Ocupantes: Cruz Filho - Josaphat Linhares - Linhares Filho.
Cadeira n° 31 - Patrono FARIAS BRITO
Ocupantes: Matos Peixoto - Leite Maranhão - Cursino Belém - Cláudio Martins – Francisco Carvalho.
Cadeira n° 32 - Patrono ULlSSES PENNAFORT.
Ocupantes: Beni Carvalho - J. W. Ribeiro Ramos - Moreira Campos - Rachei de Queiroz – Napoleão Maia Nunes.
Cadeira n° 33 - Patrono RODOLFO TEÓFILO.
Ocupantes: Perboyre e Silva - Otacílio Colares - Noemi Elisa Aderaldo.
Cadeira n° 34 - Patrono SAMUEL UCHOA.
Ocupantes: Dolor Barreira - J. Figueiredo Filho - José Denizard Macedo - ­Vinícius Barros Leal.
Cadeira n° 35 - Patrono TOMÁS POMPEU.
Ocupantes: Monte Arrais - Livino de Carvalho - Cândida Galeno - Argos Vasconcelos – Alberto de Oliveira.
Cadeira n° 36 - Patrono SENADOR POMPEU.
Ocupantes: Tomás Pompeu - Adauto Fernandes - Hugo Catunda­ - Carlos d' Alge.
Cadeira n° 37 - Patrono TOMÁS LOPES.
Ocupantes: Carlos Câmara - Mozart Firmeza - Manoel Albano Amora - ­Teoberto Landim.
Cadeira n° 38 - Patrono TIBÚRCIO RODRIGUES.
Ocupantes: José Martins Rodrigues - Menezes Pimentel - F. S. Nascimento. .
Cadeira n° 39 - Patrono ARARIPE JÚNIOR .
Ocupantes: Cursino Belém - Cruz Filho - Plácido Castelo - José Rebouças Macambira - Mauro Benevides.
Cadeira n° 40 - Patrono VISCONDE DE SABÓIA.
Ocupantes: Leiria de Andrade - Pompeu Filho - Artur Eduardo Benevides.

Academia Cearense de Letras


O melhor texto, sinteticamente falando, sobre a Academia Cearense de Letras de que eu disponho é este, do acadêmio Sânzio de Azevedo, publicado numa antologia da instituição, em comemoração ao seu primeiro centenário, em 1994. Portanto, o texto é desatualizado, mas, ainda assim, é bastante informativo.

A ACADEMIA CEARENSE DE LETRAS

FUNDADA em Fortaleza no dia 15 de agosto de 1894, sob a designação de Academia Cearense, é em nossos dias a Academia Cearense de Letras a mais antiga de todas as academias culturais do País. É verdade que, ao surgir, não eram exclusivamente literários os seus objetivos, uma vez que, ao lado das letras propriamente ditas, abrangia ela o campo das ciências, da educação, ou da arte, de um modo geral. Basta lembrar que, no livro que a agremiação pretendia publicar, e que se intitularia O Ceará em 1896, era desejo dos acadêmicos estudar o Estado sob inúmeros aspectos, dentre os quais o solo, com sua estrutura física e sua topografia; a flora e a fauna; o povoamento, as raças, os costumes; a higiene; crenças e religiões; artes e letras; cultura científica; educação; política; organização militar; organização eclesiástica; agricultura, indústria, comércio, finanças, história, etc. Mas haveria de transformar-se em Academia Cearense de Letras, designação mais consentânea com a função que assumiria pelos tempos afora.
Inspirada pela Academia de Ciências de Lisboa, teve a Academia Cearense como fundadores Guilherme Studart (1856­-1938), Justiniano de Serpa (1856-1923), Farias Brito (1862-1917), Drumond da Costa (?-?), José Fontenele (1869-1905), Álvaro de Alencar (1861-1945), Benedito Sidou (1864-1926), Franco Rabelo (1861-1929), Antônio Augusto (1852-1930), Pedro de Queirós (1854-1918), Alves Lima (1869-1958), Valdemiro Cavalcante (1869-1914), Tomás Pompeu (1852-1929), Raimundo de Arruda (1863-1934), Álvaro Mendes (1863-1940), José Carlos Júnior (1860-1896), Virgílio de Morais (1845-1914), José de Barcelos (1843-1919), Antônio Bezerra (1841-1921), Eduardo Studart (1863­-1955), Adolfo Luna Freire (1864-1953), Eduardo Salgado (1864-­1934), Alcântara Bilhar (1848-1905), Antonino Fontenele (1863­-1937), Antônio Teodorico (1861-1939), Padre Valdivino Nogueira (1866-1921), e Henrique Théberge (1838-1905).
Com a morte de José Carlos Júnior, entrou na Academia Rodrigues de Carvalho.
Foram presidentes da Academia Cearense Guilherme Studart (em caráter provisório), Tomás Pompeu e Pedro de Queirós.
Quando ampliou seu quadro para quarenta sócios e mudou sua designação para Academia Cearense de Letras, em 1922, teve como presidente outra vez Tomás Pompeu, dando-se a Presidência de Honra a Justiniano de Serpa; depois da reorganização de 1930, teve a Academia como presidentes: Antônio Sales, Tomás Pompeu Sobrinho, Dolor Barreira, ficando Pompeu Sobrinho na Presidência de Honra, posto em que permaneceria nas gestões de Mário Unhares, Raimundo Girão, Andrade Furtado, Renato Braga, Antônio Martins Filho e Eduardo Campos; depois, ocupando a Presidência de Honra Antônio Martins Filho, a Academia teria como presidentes Cláudio Martins e o atual, Artur Eduardo Benevides.
Historiando, embora sucintamente, as reorganizações pelas quais passou o grêmio, lembraremos que, não obstante o alto nível da Revista da Academia Cearense, que surgira em 1896, ela deixou de circular em 1914. Na verdade, desde os primeiros anos do século XX a Academia vinha diminuindo o ímpeto de suas atividades. Dolor Barreira haveria de fazer esta observação: "Nota­-se que, de 1902 em diante, rareiam as sessões da Acader Cearense, chegando, mesmo, a cessarem por completo. "(1) Certo é que a agremiação estava de tal maneira apagada por volta de 1922 que Leonardo Mota, em palestra no Salão Juvenal Galeno, lamentou não houvesse no Ceará uma academia de letras, e isso na presença do então Presidente do Estado, Justiniano de Serpa, um dos fundadores da Academia Cearense. O que levou este homem público a convidar o autor de Cantadores para, juntamente com ele, Tomás Pompeu e o Barão de Studart, tratarem da reorganização da Academia. Segundo o depoimento de Leota, "Estabeleceu-se preliminarmente que a nova instituição seria mera reconstituição da primitiva Academia de 1894, aumentando-se para quarenta o número de acadêmicos. "(2) A exemplo da Academia Brasileira de Letras (que já se havia inspirado na Academia da França, fundada por Richelieu), o cenáculo cearense teria um patrono para cada cadeira, ficando sua denominação mudada, para Academia Cearense de Letras. Dos vinte e sete antigos componentes, oito ainda residiam em Fortaleza.
Fundamentados nas pesquisas de Raimundo Girão, damos a seguir a lista das quarenta cadeiras, com seus respectivos patronos seguidos pelos ocupantes, observando que, da Cadeira n° 33 à de n° 39, não haviam sido escolhido patronos. Grifamos os nomes dos que figuraram na lista dos fundadores:

1) JOSÉ DE ALENCAR - Justiniano de Serpa. 2) PAULlNO NOGUEIRA - Guilherme Studart. 3) SENADOR POMPEU - Tomás Pompeu. 4) JOAQUIM CATUNDA - Antônio Augusto. 5) ADOLFO CAMINHA - Alf. Castro. 6) FAUSTO BARRETO - Tomás Pompeu Sobrinho. 7) LlBERATO BARROSO - Antonino Fontenele. 8) ÁLVARO MARTINS - Alba Valdez. 9) TOMÁS LOPES - Carlos Câmara. 10) LÍVIO BARRETO - Sales Campos. 11) ANTÔNIO BEZERRA - Otávio Lobo. 12) ARARIPE JÚNIOR - Cursino Belém. 13) MARTINHO RODRIGUES - Soares Bulcão. 14) ANTÔNIO IBIAPINA - Jorge de Sousa. 15) ANTÔNIO MARTINS - José Uno. 16) PADRE IBIAPINA - Júlio Ibiapina. 17) JOSÉ AVELlNO - Álvaro de Alencar. 18) M. SOARES S. BEZERRA - Andrade Furtado. 19) GENERAL TIBÚRCIO - Raimundo de Arruda. 20) TRISTÃO DE ARARIPE - Antônio Drumond. 21) OLIVEIRA SOBRINHO - ­Raimundo Ribeiro. 22) PAULA NEI - Quintino Cunha. 23) JOSÉ SOMBRA (PAI) - José Sombra, filho. 24) HERÁCLlTO GRAÇA ­Ferreira dos Santos. 25) VALDEMIRO CAVALCANTE - Francisco Prado. 26) VISCONDE DE SABÓIA - Leiria de Andrade, 27) ROCHA LIMA - Cruz Filho. 28) JOÃO BRÍGIDO - Antônio Teodorico. 29) FARIAS BRITO - Matos Peixoto. 30) ALBERTO NEPOMUCENO - Beni Carvalho. 31) DOMINGOS OLÍMPIO - ­Fernandes Távora. 32) FRANKUN TÁVORA - Leonardo Mota. 33) ­---- Antônio Sales. 34) ---- Pápi Junior. 35) ---- Padre João A. da Frota. 36) ---- Rodolfo Teófilo. 37) ----Adonias Lima. 38) ---- Júlio Maciel. 39) ---- Moreira de Azevedo. 40) Luís DE MIRANDA - ­Padre Antônio Tomás.(3)
É ainda Leonardo Mota quem revela que, "apesar de tudo a Academia não vingou. O desânimo inicial sobreveio, por haverem sido suspensas as reuniões no Palácio da Presidência, em razão da longa enfermidade que prostrara Justiniano de Serpa, o qual veio a falecer a 1 de Agosto de 1923. A morte de Serpa acarretou a do cenáculo de que ele era o preclaro animador".(4) Aconteceu porém que, anos mais tarde, tendo assumido o Governo do Estado José Carlos de Matos Peixoto (que havia figurado entre os 40 componentes da Academia em 1922), houve nova reorganização, desta vez em 1930, sob a inspiração do historiador Válter Pompeu. A Revista da Academia Cearense de Letras, que começa a circular em fevereiro de 1937, traz a indicação segunda fase, para significar que a primeira tinha sido aquela de 1896 a 1914. Fora excluídos membros não residentes no Ceará e, na citada revista, depois de se dizer que a primeira sessão se realizou em 21 de maio de 1930, tendo sido eleito Antônio Sales presidente efetivo, adverte-se que, "como se soubesse que certos membros excluídos não se conformavam com a exclusão, ficou resolvido que os Estatutos diriam constitui-se, e não reconstitui-se, como se estabelecera. Isso, sem que, de maneira alguma, fosse pensamento de qualquer dos promotores da refundição criar em verdade uma nova academia, pois todos queriam continuar as tradições existentes, já quase meio seculares".(5) Diga-se, porém, por amor à verdade histórica, que pelo menos nos primeiros tempos a Academia Cearense de Letras de 1930 pretendeu ser uma entidade autônoma, sem liames com o passado. Numa "Exposição de Motivos" estampada no Diário do Ceará e datada de 29 de maio de 1930 há trechos que deixam isso claro, como este: "Já duas vezes se pretendeu erguer entre nós uma corporação representativa da atividade intelectual, e é esta a terceira, portanto, que se faz a fundação de uma Academia de Letras no Ceará. Da Academia Cearense perdem-se na poeira dos arquivos as pálidas reminiscências; da Academia Cearense criada em 1922, como uma das partes do programa comemorativo do Centenário da Independência do Brasil, nunca houve a menor parcela de iniciativa para o cumprimento do que deveria constituir um ato de presença, a sua finalidade." Como já dissemos em nossa Literatura Cearense (1976), deve-se levar o tom acre à conta do desabafo contra o marasmo de nossa vida intelectual no início da década de trinta, lembrando que, poucos anos depois, todos os acadêmicos eram unânimes em considerar a entidade realmente o prolongamento da mesma que se inaugurara em 1894 e se reorganizara em 1922, tanto assim que, segundo já foi aqui referido, a revista, embora com a indicação do "volume I - tomo I", de 1937, traz abaixo dela esta outra: segunda fase.
Nesse mesmo ano de 1930 foi criada em Fortaleza outra associação literária, denominada Academia de Letras do Ceará, fazendo parte dela escritores independentes de grupos, ao lado de alguns membros da Academia Cearense de Letras e de alguns sócios de agremiação em 1922, mas excluídos na segunda reorganização. Mário Linhares, em 1948, residindo no Rio de Janeiro, fala, num livro, sobre a existência dessas duas academias, e transcreve um texto em que Martins d'Alvarez lamenta: -"É pena que as duas 'Academias' do Ceará não se fundam numa só, como tem acontecido em vários Estados da Federação, para que haja maior equilíbrio, harmonia e força expressional nas letras da terra alencariana." E o poeta dos Florões concorda com a idéia de que “a fusão dessas duas 'Academias' seria um belo gesto de confraternização espiritual".(6) As duas agremiações terminaram efetivamente por fundir-se em 1951, graças aos esforços de Dolor Barreira, Clodoaldo Pinto e Joel Linhares, pela Academia Cearense de Letras, e de Henriqueta Galeno, Manoel Albano Amora e Perboyre e Silva, pela Academia de Letras do Ceará, com o que eram finalmente atendidos os apelos feitos, de longe, por Martins d'Alvarez e por Mário Lnhares. Nessa ocasião, Dolor Barreira foi eleito, por aclamação, presidente da Academia Cearense de Letras, que esta teria de ser a denominação vitoriosa para o cenáculo.
Com a reorganização de 1930, houve mudança de alguns patronos, que doravante serão dispostos em ordem alfabética de seus prenomes. Eis a lista dos quarenta de 1930:
1) ADOLFO CAMINHA - Ermínio de Araújo. 2) AGAPITO DOS SANTOS - Amora Maciel. 3) ÁLVARO MARTINS - Luís Sucupira. 4) ANTÔNIO AUGUSTO - J. J. Pontes Vieira. 5) ANTÔNIO BEZERRA - Antônio Furtado. 6) ANTÔNIO POMPEU ­Tomás Pompeu Sobrinho. 7) ARARIPE JÚNIOR - Cruz Filho. 8) CAPISTRANO DE ABREU - Válter Pompeu. 9) DOMINGOS OLÍMPIO - Fernandes Távora. 10) FARIAS BRITO - Matos Peixoto. 11) FAUSTO BARRETO - Carvalho Júnior. 12) FRANKLlN TÁVORA - Joel Lnhares. 13) HERÁCLlTO GRAÇA - Natanael Cortez. 14) D. JERÔNIMO - Padre Misael Gomes. 15) JOÃO BRÍGIDO - Jáder de Carvalho. 16) JOÃO MOREIRA - Antônio Teodorico. 17) JOAQUIM CATUNDA - Renato Braga. 18) D. JOAQUIM - Andrade Furtado. 19) JOSÉ ALBANO - Martinz de Aguiar. 20) JOSÉ DE ALENCAR - Antônio Sales. 21) LlBERATO BARROSO - Clodoaldo Pinto. 22) JUSTINIANO DE SERPA - Leiria de Andrade. 23) LÍVIO BARRETO - Elias Mallmann. 24) MÁRIO DA SILVEIRA - Júlio Maciel. 25) PADRE MORORÓ – Demócrito Rocha. 26) MOURA BRASIL - Otávio Lôbo. 27) OLIVEIRA PAIVA - ­Pápi Júnior. 28) OTO DE ALENCAR - José Sombra, filho. 29) PAULlNO NOGUEIRA - Carlos Studart Filho. 30) SENADOR POMPEU - Adauto Fernandes. 31) POMPÍLlO CRUZ - Mozart Pinto. 32) ROCHA LIMA - Josaphat Lnhares. 33) VISCONDE DE SABÓIA - Tomás Pompeu Filho. 34) SAMUEL UCHOA - Dolor Barreira. 35) SORIANO DE ALBUQUERQUE - Teodoro Cabral. 36) TIBÚRCIO RODRIGUES - J. Martins Rodrigues. 37) TOMÁS LOPES - Mozart Firmeza. 38) TOMÁS POMPEU - Monte Arrais. 39) ULlSSES PENNAFORT - Beni Carvalho. 40) VALDEMIRO CAVALCANTE - Emídio Barbosa.
Antônio Bezerra e Farias Brito, fundadores em 1894, passam a patronos em 1922 e permanecem em 1930, quando outros fundadores também passam a patronos: Antônio Augusto, Justiniano de Serpa, Tomás Pompeu, Ulisses Pennafort e Valdemiro Cavalcante; três destes últimos haviam sido acadêmicos em 1922. Outras modificações seriam introduzidas na fusão das duas academias em 1951.
Aqui damos a lista das quarenta Cadeiras da Academia Cearense de Letras hoje, com seus respectivos patronos e ocupantes. Com base no livro A Academia de 1894, de Raimundo Girão, damos as datas em que os Patronos foram escolhidos. Naturalmente atualizamos a lista dos acadêmicos, considerando que a citada obra do saudoso historiador é de 1975:
Cadeira n° 1 - Patrono ADOLFO CAMINHA (1922). Ocupantes: Alf. Castro - Ermínio de Araújo - Sidney Neto - Sânzio de Azevedo.
Cadeira n° 2 - Patrono ÁLVARO MARTINS (1922). Ocupantes: Alba Valdez(7) - Luís Sucupira.
Cadeira n° 3 - Patrono ANTÔNIO AUGUSTO (1930). Ocupantes: J. J. Pontes Vieira - Antonio Martins Filho.
Cadeira n° 4 - Patrono ANTÔNIO BEZERRA (1922). Ocupantes: Otávio Lôbo - Antônio Furtado - Raimundo Girão(8) ­Mílton Dias - Joaryvar Macedo - José Murilo Martins.
Cadeira n° 5 - Patrono PÁPI JÚNIOR (1951). Ocupantes: Epifânio Leite (que não assumiu) - Fran Martins.
Cadeira n° 6 - Patrono ANTÔNIO POMPEU (1930). Ocupantes: Tomás Pompeu Sobrinho - F. Alves de Andrade.
Cadeira n° 7 - Patrono CLÓVIS BEVILÁQUA (1922). Ocupantes: Mário Linhares - Nertan Macedo - Marly Vasconcelos.
Cadeira n° 8 - Patrono DOMINGOS OLíMPIO (1922). Ocupantes: Fernandes Távora - Aderbal Sales - Horácio Dídimo.
Cadeira n° 9 - Patrono FAUSTO BARRETO (1922). Ocupantes: Tomás Pompeu Sobrinho(9) - Carvalho Júnior - ­Alencar Matos - João Clímaco Bezerra.
Cadeira n° 10- Patrono PADRE MORORÓ (1930). Ocupantes: Demócrito Rocha - Abelardo F. Montenegro.
Cadeira n° 11 - Patrono BARÃO DE STUDART (1951). Ocupantes: Joaquim Alves - José Valdivino - Dimas Macedo.
Cadeira n° 12 - Patrono HERÁCLlTO GRAÇA (1922). Ocupantes: Ferreira dos Santos - Natanael Cortez - J. C. Alencar Araripe.
Cadeira n° 13 - Patrono D. JERÔNIMO TOMÉ DA SILVA (1930). Ocupantes: Padre Misael Gomes - Ribeiro Ramos.
Cadeira n° 14 - Patrono JOÃO BRÍGIDO (1922). Ocupantes:Antônio Teodorico - Jáder de Carvalho - Barros Pinho.
Cadeira n° 15 - Patrono CAPISTRANO DE ABREU (1930). Ocupantes: Válter Pompeu - Braga Montenegro - Padre F. Sadoc de Araújo.
Cadeira n° 16 - Patrono FRANKLlN TÁVORA (1930). Ocupantes: Leonardo Mota - Joel Unhares - Newton Gonçalves (falecido).
Cadeira n° 17 - Patrono JOAQUIM CATUNDA (1922). Ocupantes: Antônio Augusto - Renato Braga - Paulo Bonavides.
Cadeira n° 18 - Patrono MOURA BRASIL (1930). Ocupantes:Otávio Lôbo - Antônio Girão Barroso - Geraldo Fontenelle.
Cadeira n° 19 - Patrono JOSÉ ALBANO (1930). Ocupantes: Martinz de Aguiar - Mozart Soriano Aderaldo.
Cadeira n° 20 - Patrono LlBERATO BARROSO (1922). Ocupantes: Antonino Fontenele - Clodoaldo Pinto - Cid Sabóia de Carvalho.
Cadeira n° 21 - Patrono JOSÉ DE ALENCAR (1922). Ocupantes: Justiniano de Serpa - Antônio Sales - Filgueiras Lima ­- Raimundo Girão - Osmundo Pontes.
Cadeira n° 22 - Patrono JUSTINIANO DE SERPA (1930). Ocupantes: Leiria de Andrade - Alba Valdez - Eduardo Campos.
Cadeira n° 23 - Patrono JUVENAL GALENO (1951). Ocupantes: Henriqueta Galeno - Florival Seraine.
Cadeira n° 24 - Patrono LÍVIO BARRETO (1922). Ocupantes: Sales Campos - Elias Mallmann - Gastão Justa - Pedro Paulo Montenegro.
Cadeira n° 25 - Patrono OLIVEIRA PAIVA (1930). Ocupantes: Pápi Júnior - Carlyle Martins - Pedro Henrique Saraiva Leão.
Cadeira n° 26 - Patrono MANUEL SOARES DA SILVA BEZERRA (1922). Ocupantes: Andrade Furtado - Otacílio de Azevedo - Lúcio Alcântara.
Cadeira n° 27 - Patrono SORIANO DE ALBUQUERQUE (1930). Ocupantes: Teodoro Cabral - Adonias Uma - Durval Aires ­ - César Barros Leal.
Cadeira n° 28 - Patrono MÁRIO DA SILVEIRA (1930). Ocupantes: Júlio Maciel - João Jacques.
Cadeira n° 29 - Patrono PAULlNO NOGUEIRA (1922). Ocupantes: Barão de Studart - Carlos Studart Filho - Itamar Espíndola - Costa Matos.
Cadeira n° 30 - Patrono ROCHA LIMA (1922). Ocupantes: Cruz Filho(10) - Josaphat Unhares - Linhares Filho.
Cadeira n° 31 - Patrono FARIAS BRITO (1922). Ocupantes: Matos Peixoto - Leite Maranhão - Cursino Belém - Cláudio Martins.
Cadeira n° 32 - Patrono ULlSSES PENNAFORT (1930). Ocupantes: Beni Carvalho - J. W. Ribeiro Ramos - Moreira Campos - Rachei de Queiroz.
Cadeira n° 33 - Patrono RODOLFO TEÓFILO (1951). Ocupantes: Perboyre e Silva - Otacílio Colares - Noemi Elisa Aderaldo.
Cadeira n° 34 - Patrono SAMUEL UCHOA (1930). Ocupantes: Dolor Barreira - J. Figueiredo Filho - José Denizard Macedo - ­Vinícius Barros Leal.
Cadeira n° 35 - Patrono TOMÁS POMPEU (1930). Ocupantes: Monte Arrais - Livino de Carvalho - Cândida Galeno - Argos Vasconcelos (falecido).
Cadeira n° 36 - Patrono SENADOR POMPEU (1922). Ocupantes: Tomás Pompeu - Adauto Fernandes - Hugo Catunda­ - Carlos d' Alge.
Cadeira n° 37 - Patrono TOMÁS LOPES (1922). Ocupantes: Carlos Câmara - Mozart Firmeza - Manoel Albano Amora ­Teoberto Landim.
Cadeira n° 38 - Patrono TIBÚRCIO RODRIGUES (1930). Ocupantes: José Martins Rodrigues - Menezes Pimentel - F. S. Nascimento. .
Cadeira n° 39 - Patrono ARARIPE JÚNIOR (1922). Ocupantes: Cursino Belém(11) - Cruz Filho - Plácido Castelo - José Rebouças Macambira - Mauro Benevides.
Cadeira n° 40 - Patrono VISCONDE DE SABÓIA (1922). Ocupantes: Leiria de Andrade(12) - Pompeu Filho - Artur Eduardo Benevides.
Pápi Júnior e Rodolfo Teófilo, que haviam ocupado cadeiras em 1922 sem escolher patronos, passaram eles próprios, em 1951, a patronos, como vimos. Observando-se a relação de acadêmicos de 1922, vê-se que eram patronos (e deixaram de o ser) Martinho Rodrigues, Antônio Ibiapina, Antônio Martins, Padre Ibiapina, José Avelino, General Tibúrcio, Tristão de Alencar Araripe, Oliveira Sobrinho, Paula Ney, José Sombra, Valdemiro Cavalcante, Alberto Nepomuceno e Luís de Miranda. Na de 1930, eram patronos (e igualmente foram substituídos) Agapito dos Santos, Pompílio Cruz, Dom Joaquim, João Moreira e Oto de Alencar. Luís Sucupira, num estudo sobre o poeta Antônio Martins - um dos autores das Três Liras, de 1883, ao lado de Antônio Bezerra e Justiniano de Serpa, lamentando o esquecimento que tem pesado sobre o nome do escritor, depois de se referir à Academia Cearense de Letras, diz: "Patrono de uma de suas primitivas cadeiras, estabelecidas em 1922, teve seu nome relegado na reforma de 1930."(13) Trata-se aqui de um caso de patrono cujo nome foi riscado da nova lista, mas não custa lamentarmos também que não se haja lembrado do nome de Antônio Sales para patrono de uma das cadeiras na última reforma, a de 1951.
A verdade é que não seria possível homenagear, em apenas quarenta cadeiras, todos os grandes vultos da cultura cearense. Na Academia, porém, através de palestras em suas sessões ou em cursos especiais, ou nas páginas de sua revista, têm sido homenageadas inúmeras figuras do passado e do presente que hajam contribuído para o enriquecimento intelectual de nossa terra.
Honrado com o convite do poeta Artur Eduardo Benevides, Presidente da Academia Cearense de Letras, para organizar esta Antologia contendo textos de todos os membros do Cenáculo em 1994, ano do seu Centenário, ocorreu-nos solicitar a cada um dos confrades a escolha de sua própria página de ensaio, ficção, poesia, memorialismo ou oratória, esperando com isso evitar a possibilidade de ser escolhido um texto que não esteja entre os que o autor mais preza. Nos casos em que, por qualquer motivo, não foi possível a escolha do próprio autor, foi forçado o organizador a fazer a seleção, procurando o que lhe pareceu melhor ou mais oportuno.
Quanto aos dados biobibliográficos de vários acadêmicos, valemo-nos às vezes de obras como a Enciclopédia de Literatura Brasileira (1990), de Afrânio Coutinho e J. Galante de Sousa; o Dicionário Literário Brasileiro (1978), de Raimundo de Menezes; e o Dicionário da Literatura Cearense (1987), de Raimundo Girão e Maria da Conceição Souza. No caso de acadêmicos que também fazem parte do Instituto do Ceará, compulsamos Os 40 da Casa do Barão (1993), de Rubens de Azevedo. Para esta introdução, além da História Literária do Ceará (1948), de Mário Linhares, do primeiro volume da História da Literatura Cearense (1948), de Dolor Barreira, e de A Academia de 1894 (1975), de Raimundo Girão, recorremos a vários números das três fases da Revista da Academia Cearense de Letras, ao livro A Academia Cearense de Letras (1957), de Manoel Albano Amora, além de trabalhos esparsos de Leonardo Mota, de Mozart Soriano Aderaldo e de outros escritores conterrâneos e, naturalmente, ao capítulo que sobre o grêmio incluímos na nossa Literatura Cearense (1976), editada pela Academia graças aos esforços de Cláudio Martins.
Estão os acadêmicos dispostos seguindo os números de suas respectivas Cadeiras, as quais seguem a ordem alfabética dos prenomes dos Patronos. Somente por este critério se poderá justificar o fato de a Antologia se iniciar justamente com o organizador. .
Agradecemos a quantos nos ajudaram neste trabalho, que pretende retratar, em seu Centenário, a atualidade da mais antiga Academia de Letras do Brasil.

Sânzio de Azevedo

NOTAS

1) BARREIRA, Dolor. História da literatura cearense. Fortaleza, Instituto do Ceará, v. 1, 1948, p. 190.
2) Apud BARREIRA, Dolor. Op. cit., p. 196.
3) Na lista que figura na História da literatura cearense (1948) de Dolor Barreira, o Padre Antônio Tomás está sem Patrono.
4) Apud BARREIRA, Dolor. Op. cit., p. 200.
5) "A Academia", In Revista da Academia Cearense de Letras, v.1, t. 1, (segunda fase). Fortaleza, 1937, p. 81.
6) LINHARES, Mário. História literária do Ceará. Rio de Janeiro I Jornal do Comércio I, 1948, p. 147.
7) Passaria para a Cadeira n° 22.
8) Passaria para a Cadeira n° 21
9) Como vimos, era da Cadeira n° 6.
10) Passaria para a Cadeira n° 39.
11) Passaria para a Cadeira n° 31.
12) Passaria para a Cadeira n° 22
13) SUCUPIRA, Luís. "Antônio Martins, o Jornalista", In Revista da Academia Cearense de Letras, n° 46, Fortaleza, 1985-86, p. 21


(Antologia da Academia Cearense de Letras - Edição do Centenaário. Organização Sânzio de Azevedo. Fortaleza, 1994).

Rafael SÂNZIO DE AZEVEDO (1938)

Filho do poeta e pintor Otacílio de Azevedo, é poeta, ficcionista e, especialmente, ensaísta. Professor Doutor (pela UFRJ) do curso de Letras da Universidade Federal do Ceará. Membro da ACL desde 1973, vem desempenhando um papel importantíssimo como pesquisador, especialmente no que diz respeito às letras do Ceará. Seu mais novo livro é o magnífico estudo O Parnasianismo na Poesia Brasileira (2004), o mais amplo trabalho neste sentido.