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Location: Fortaleza, Ceará, Brazil

Sunday, September 03, 2006

Temístocles Machado

Borrasca

Fora, torcendo as árvores, gargalha
A tempestade em rugidora festa;
Como o rude estridor de uma batalha,
Ruige o trovão nas comas na floresta.

A treva desenrola-se funesta
Nos ermos,como lúgubre mortalha;
A luz relampejante as flores cresta
E o ventoas grandes árvores esgalha.

Aterradora indômita, selvagem,
Tudo arrasta na hórrida passagem
A potência ciclópica das ventas.

E eu, triste e só, pergunto à noite escura:
Será maior que a minha desventura
A fúria colossal dos elementos?


IRONIA DAS FLORES
I

Foi na deserta e flórida avenida,
De um sol de Maio rútilo doirada,
Que me disseste o adeus da despedida
Convulsamente em lágrimas banhada.

Repetias chrando em voz magoadas
"Hei de amar-te por toda a minha vinha".
Tinhas sobre o meu peito a delicada
Fronte, n'esse desânimo, pendida.

Os passarinhos pelos arvoredos,
Ouvindo as doces notas que soltavas,
Souberam nossos íntimos segredos.

As brisas pelas árvores gemiam...
E na alameda, enquanto tu choravas,
Como eterno contraste as flores riam.

II

Depois de larga ausência dolorosa,
Através de desertos e de espinhos,
Volvi à terra onde deixei-te ansiosa,
Oh! visão dos meus íntimos carinhos!

Pela triste avenida silenciosa
Cantavam tristemente os passarinhos
Aquela endecha trêmelula e queixosa
Que tu, leviana, confiaste aos ninhos.

Rindo, a outra dizias, no entretanto,
Essa história de amor, hoje desfeito,
Que juraste a meus pés banhada em pranto.

As brisas pelas árvores cantavam...
Enquanto tu sorrias satisfeita
Como que as flores nos vergéis choravam.

Consolatio Miseris...

Eu escrevo versos para os desgraçados,
Falando aos corações dos infelizes,
Peas garras do tédio lacerados,
Sangrando como rubras cicatrizes.

Talvez no leito vil das meretrizes,
Na masmorra onde gemem condenados,
Possam cortar as sôfregas raízes
De cancerosos tédios ignorados.

Eu canto para alívio dos que choram,
Para os que, como eu , de joelho, imploram
Na treva a luz bendita de um carinho.

Canto para espancar as mágoas; canto
Para enxugar ao som do verso o pranto
Que vejo derramado em meu caminho!


TESMÍTOCLES MACHADO (25 de agosto de 1874 - 5 de agosto de 1921)
Nascido em Limoeiro, participou ativamente da vida intelectual cearense do fim do século XIX, na Padaria Espiritual (com o pseudônimo Túlio Guanabara) e no Centro Literário. Advogado e jornalista, viveu também no Rio de Janeiro e no Amazonas. Publicou Mirtos (1897), prefaciado por Valentim Magalhães (da Academia Brasileira de Letras), A Fileteida (1898), A Esmola (1900), O Maldito (1901), Pela República (1902), Invocação de Vítima (1904), além de um romance e um livro de biografias incompletos. É trisavô do autor desta página.

1 Comments:

Blogger Jocelino Neto said...

Se Temístocles Machado é seu trisavô então somos parentes. Meu pai, Themístocles Machado Neto, obviamente posssui parentesco direto com o "amassador". Fiquei muitíssimo feliz em encontrar peças de suas obras. A muito as procurava. Parabéns pelo Blog. :-)

12:17 PM  

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